Resumo: O presente artigo tem a função de estudar os
conflitos entre o direito de propriedade com o direito de
vizinhança. A partir disso, estipular em quais momentos um
sobrepõe ao outro, especialmente quanto às limitações do direito
de propriedade. Partindo das alterações do novo código civil de
2002 e da doutrina pátria especializada nos direitos reais,
busca-se entender como os tribunais superiores tem definido as
limitações a serem adotadas para a convivência harmoniosa entre
vizinhos e nas situações inusitadas entre duas ou mais
propriedades como as árvores limítrofes, a passagem de cabos e
tubulações, direito de construir e de tapagem, a servidão, entre
outros.
Palavras-chave: Direitos reais, propriedade, vizinhança,
conflitos, limitações
Abstract: The present article serves to study the
conflict between the Property Law in the right neighborhood. From
this, specify at what time one overlaps the other, especially the
limitations of property rights. Starting from the change of the
new Civil Code of 2002 and the homeland specialized doctrine in
Real Property Law, seeks to understand how the courts have defined
the limits to be adopted for the harmonious coexistence between
neighbors and in unusual situations between two or more properties
as bordering trees, the passage of cables and pipes, the right to
build, among others.
Keywords: Real, Property Law, conflicts, neighborhood,
limits
Sumário: Introdução. 1. Direito de vizinhança; 2. O uso
anormal da propriedade; 3. Árvores Limítrofes; 4. Passagem
Forçada; 5. Passagem de Cabos e Tubulações; 6. Águas; 7. Limite
entre Prédios e Direito de Tapagem; 8. Direito de Construir; 9.
Servidão
Introdução
O direito de propriedade está presente no Código Civil em seu
art. 1228, caput, que enuncia as faculdades do proprietário
de usar, gozar e dispor da coisa, e o direito de reavê-la do poder
de quem quer que injustamente a possua ou detenha. Esse direito é
classificado pela doutrina como o mais importante e o mais sólido
de todos os direitos subjetivos. É o chamado direito real por
excelência, ou seja, é o eixo em torno do qual gravita o direito
das coisas. Entretanto, ele é passível de sofrer limitações no
ordenamento pátrio, como exemplifica o próprio §2º do artigo
supracitado, quando afirma serem “defesos os atos
que não trazem ao proprietário qualquer comodidade, ou utilidade,
e sejam animados pela intenção de prejudicar outrem.”
As limitações ao direito de propriedade podem ser classificadas
em dois grupos: em um primeiro grupo estão as limitações de
interesse público, as quais são destinadas a impedir que o
arbítrio ou o egoísmo do proprietário prevaleça em absoluto sobre
o interesse da coletividade. No segundo grupo estão as limitações
de interesse privado, que visam conciliar os interesses do
proprietário com o de outros particulares; e que se subdividem em
limitações de mero interesse privado e limitações de interesse
semipúblico. Esta última subdivisão, segundo a doutrina, são as
que têm por fim tornar menos ásperas e conflituosas as relações
entre vizinhos e proteger a utilidade comum dos prédios contíguos.
Ou seja, a lei limita a extensão das faculdades de usar e gozar
por parte de proprietários e possuidores de prédios vizinhos,
impondo-lhes um sacrifício que precisa ser suportado para que a
convivência social seja possível e para que a propriedade de cada
um seja respeitada. Em outras palavras, “cada proprietário
compensa seu sacrifício com a vantagem que lhe advém do
correspondente sacrifício do vizinho” (ROSENVALD, 2011). E,
“se assim não fosse, se os proprietários pudessem invocar
reciprocamente seu direito absoluto, na colisão de direitos todos
estariam impossibilitados de exercer suas faculdades, pois as
propriedades aniquilar-se-iam.”
1. Direito de vizinhança
O direito de vizinhança é composto de regras que ordenam, não
apenas a abstenção da prática de certos atos, como também de
outros que implicam a sujeição do proprietário a uma invasão de
sua órbita dominial. Este autor define o direito de vizinhança
como sendo “as limitações impostas pela lei às prerrogativas
individuais e com o escopo de conciliar interesses de
proprietários vizinhos, reduzindo os poderes inerentes ao domínio
e de modo a regular a convivência” (RODRIGUES, 2002).
Podemos concluir que o direito de vizinhança é composto de
limitações expressas pelo direito positivo, que podem trazer
limitações ao alcance das faculdades de usar e gozar por parte de
proprietários e possuidores de prédios vizinhos, afixando um
encargo a ser tolerado, com a intenção maior de propiciar a
convivência social e resguardar, entre os vizinhos, o mútuo
respeito à propriedade. Maria Helena Diniz afirma que os direitos
de vizinhança podem ser apresentados em três formas distintas.
Primeiro, como restrição ao direito de propriedade, na medida em
que regulam seu exercício; em uma segunda forma, como limitações
legais ao domínio, que se assemelham a servidões; e por fim, como
restrições oriundas das relações de contiguidade entre dois
imóveis.
2. O uso anormal da propriedade
O direito de propriedade é limitado “em razão do princípio
geral que proíbe ao indivíduo um comportamento que venha a exceder
o uso normal de um direito, causando prejuízo a alguém”
(DINIZ, 2004). Rudolf Ihering, ao desenvolver sua Teoria do Uso
Normal da Propriedade, defendia que resta proibida qualquer
utilização do bem que extrapole o uso normal e acarrete uma
imissão nociva na posse ou propriedade alheia a ponto de acarretar
lesão a saúde, sossego ou segurança dos prédios vizinhos. Esta
teoria já era adotada pelo Código Civil de 1916 e continua mantida
no atual, que em seu art. 1277, caput, traz a seguinte previsão:
“O proprietário ou o possuidor de um prédio tem o
direito de fazer cessar as interferências prejudiciais à
segurança, ao sossego e à saúde dos que o habitam, provocadas pela
utilização de propriedade vizinha”.
Quando trata da segurança de um prédio, o referido dispositivo
legal busca preservar sua solidez e estabilidade material. Bem
como, a incolumidade pessoal de seus moradores, devendo ser
afastado qualquer perigo pessoal ou patrimonial. Quanto ao
sossego, busca-se assegurar o direito à privacidade, que podemos
entender como o direito dos moradores a um estado de relativa
tranquilidade, possibilitando seu descanso, paz de espírito e
incolumidade da mente. Por fim, do conceito de saúde podemos
entender o estado da pessoa cujas funções biológicas estão
normais, tanto física quanto psíquicas. Ressalta-se, ainda, que há
uma conexão entre essas garantias e, eventualmente, pode ocorrer
situações em que reiteradas ofensas ao sossego possam vir a
implicar em atentado à saúde da pessoa.
O conceito de uso nocivo da propriedade determina-se
relativamente, mas não se condiciona à intenção do ato praticado
pelo proprietário. O propósito de prejudicar, ou incomodar, pode
não existir e, ainda assim, será considerado o uso anormal da
propriedade. O limite entre uso normal e anormal não pode ser
teorizado, pois somente no caso concreto é que poderemos definir
os limites que devem ser tolerados pelos vizinhos, uma vez que
pequenos incômodos devem ser suportados para que a vida em
sociedade seja possível.
Tal limite deve ser aferido pela média das pessoas, sem levar
em consideração a sensibilidade excessiva de uns ou a rudez de
outros. Ou seja, na hipótese de um vizinho causar incômodos
normais a outro vizinho, que sejam resultados do uso normal de sua
propriedade, estes não garantirão ao prejudicado nenhum direito,
uma vez que o ato é lícito assim como os danos. Já na hipótese de
um vizinho causar incômodos anormais, mas socialmente necessários
ou fazendo uso normal de sua propriedade, tem-se garantido ao
prejudicado direito à indenização, pois o ato, embora lícito,
gerou danos ilícitos. Por fim, na hipótese de um vizinho causar
danos anormais em atividade sem interesse social e ainda devido ao
uso anormal de sua propriedade garante ao prejudicado a cessação
do uso, uma vez que tanto o ato como o dano são ilícitos.
A jurisprudência do STJ adota um entendimento de que os
aborrecimentos comuns do dia a dia, “os meros dissabores normais e
próprios do convívio social”, não são suficientes para dar origem
a danos morais indenizáveis. Apesar de haver jurisprudência no STJ
considerando a infiltração em apartamento de um mero dissabor, a
Terceira Turma julgou uma situação de grande constrangimento, que
perdurou durante muitos meses, como exceção à regra. Trata-se de
ação de indenização por danos materiais e morais contra a vizinha
do apartamento superior ajuizada em 2006. A moradora prejudicada
conviveu por mais de um ano e meio com infiltração na laje do teto
da sua área de serviço que se alastrou por praticamente todo
apartamento sem que fosse tomada nenhuma providência pelo
proprietário do imóvel do andar de cima. O ministro Sidnei Beneti,
relator do recurso especial, mencionou que o constrangimento e os
aborrecimentos pelos quais a mulher passou não eram “um mero
aborrecimento ou dissabor comum das relações cotidianas.” Para
ele, “tem-se verdadeiro dano a direito de dignidade, passível de
reparação por dano moral”.
“EMENTA: INDENIZAÇÃO. DANO MORAL. CONDENAÇÃO. DIREITO DE
VIZINHANÇA. DANOS EM APARTAMENTO INFERIOR PROVOCADOS POR
INFILTRAÇÃO EM APARTAMENTO SUPERIOR. DURAÇÃO POR LONGO TEMPO
RESULTANDO CONSTANTE E INTENSO SOFRIMENTO PSICOLÓGICO. DESÍDIA DE
RESPONSÁVEL EM REPARAR A INFILTRAÇÃO.
1.- Condena-se ao pagamento de indenização por dano moral o
responsável por apartamento de que se origina infiltração não
reparada por longo tempo por desídia, provocadora de constante
e intenso sofrimento psicológico ao vizinho, configurando mais do
que mero transtorno ou aborrecimento.
2.- Recurso Especial provido.” [grifo próprio] (Superior
Tribunal de Justiça – Terceira Turma / REsp 1125153 RS / Relator:
Min. Massami Uyeda / Julgado em 04/10/2012 / Publicado em
04/10/2012)
Os proprietários que tenham sido prejudicados, na condição de
vizinhos, pelo mau uso da propriedade de outro podem se utilizar
de alguns remédios jurídicos. São eles: a ação indenizatória
quando os incômodos já cessaram mas o prejudicado pretende o
reestabelecimento da situação fática precedente ao ilícito; a ação
cominatória quando o intento do prejudicado for impor o fim do uso
nocivo, com imposição de multa diária caso o devedor se recuse a
prestar a conduta indicada; e, finalmente, a ação de dano infecto
quando houver justo receio de vir a ser prejudicado por prédio
vizinho abandonado e em ruínas.
Há um entendimento recente da Terceira Turma do STJ sobre uso
indevido que prevê, nos casos de imóveis alugados, o dever do
locador proprietário de zelar pelo uso adequado de sua
propriedade. Isto abrange a correta destinação dada pelo
inquilino, principalmente no que se refere à higiene e limpeza da
unidade objeto da locação. No Condomínio Residencial Suíte Service
há uma regra que obriga os condôminos a permitir o acesso às suas
unidades para que sejam realizados serviços de limpeza. Alegando
que as condições precárias de higiene de uma unidade afetam os
demais condôminos, causando-lhes riscos à saúde e ao bem-estar no
prédio, o condomínio moveu ação cominatória contra uma locatária.
Esta, mesmo notificada dessa obrigação, não permitiu que os
funcionários responsáveis pela limpeza entrassem em seu
apartamento.
“EMENTA: RECURSO ESPECIAL - DIREITO CIVIL - CONDOMÍNIO -
LOCAÇÃO - DESCUMPRIMENTO DOS DEVERES CONDOMINIAIS PELO LOCATÁRIO -
AUSÊNCIA DE HIGIENE E LIMPEZA DA UNIDADE - IDENTIFICAÇÃO, NA
ESPÉCIE - LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM - PROPRIETÁRIO - DIREITO
DE VIZINHANÇA - OBRIGAÇÃO PROPTER REM - RECURSO ESPECIAL
IMPROVIDO.
I - O locador mantém a posse indireta do imóvel, entendida
como o poder residual concernente à vigilância, à conservação ou
mesmo o aproveitamento de certas vantagens da coisa, mesmo depois
de transferi-la a outrem o direito de usar o bem objeto da
locação.
II - Na condição de proprietário, ao locador cumpre zelar
pelo uso adequado de sua propriedade, assegurando-se da correta
destinação dada pelo inquilino mormente no que se refere à questão
concernente à higiene e limpeza da unidade objeto da locação que
possui grave repercussão social, podendo, assim, interferir na
esfera de saúde dos demais condôminos.
III - Ao proprietário é conferido instrumento coercitivo
apto a compelir o locatário a cumprir as determinações
condominiais, inclusive com a possibilidade de ajuizamento de ação
de despejo, nos termos da Lei n.º 8.245⁄91.
IV - Assim, tratando-se de direito de vizinhança a
obrigação é propter rem, ou seja, decorre da propriedade da coisa.
Por isso, o proprietário, com posse indireta, não pode se eximir
de responder pelos danos causados pelo uso indevido de sua
propriedade.
V - Em resumo: o proprietário, em razão da natureza propter
rem da obrigação, possui legitimidade passiva ad causam para
responder por eventuais danos relativos a uso de sua propriedade.”
[grifo próprio] (Superior Tribunal de Justiça – Terceira Turma /
REsp 1125153 RS / Relator: Min. Massami Uyeda / Julgado em
04/10/2012 / Publicado em 04/10/2012)
3. Árvores Limítrofes
Remetendo aos preceitos consolidados ainda no Direito Romano, a
existência de árvores limítrofes pode ser considerada uma das mais
antigas relações de vizinhança, sendo historicamente utilizadas
como marcos dos limites das propriedades ou territórios. Nessas
situações, explica Venosa, a regra é serem as árvores partes
integrantes dos prédios. Para este efeito, considera-se qualquer
tipo de árvore, nascida naturalmente, semeada ou plantada. Quanto
a sua ocorrência, a doutrina desenvolve em três fatos principais
que trataremos a seguir.
A primeira situação possível, encontra-se prevista no artigo
1.282 do Código Civil, e dá-se quando a árvore tem seu tronco na
linha divisória. Hipótese em que subsiste a presunção iuris
tantum de pertencer esta, em partes iguais, aos dois vizinhos
em condomínio. Ou seja, é considerada coisa comum, sendo possível,
prova em contrário, proveniente de documento ou ainda decorrente
de evidência específica ou ainda oriunda das circunstâncias do
caso concreto. Os frutos e o tronco respeitam a mesma regra, assim
como os gastos com sua conservação e colheita que deverão ser
comportados igualmente. Um vizinho não poderá cortá-la ou
arrancá-la sem que o outro concorde e, quando cortada, deverá ser
repartida entre ambos. Cada um deve indenizar o outro por
eventuais prejuízos que der causa. Pontes de Miranda denomina tal
árvore de árvore-meia, pois a cada proprietário pertence
metade da coisa.
A segunda situação prevista, encontra respaldo jurídico no
artigo 1.284 do Código Civil, e ocorre quando os frutos caírem
naturalmente no terreno vizinho. Neste caso, pertencerão ao dono
do local da queda, configurando, segundo Venosa, exceção ao
princípio de que o bem acessório sempre segue o bem principal. Tal
regra é oriunda do direito germânico e está fixada na ideia de que
quem arca o ônus fica com o bônus. Ressalta-se que se o dono do
terreno particular provoca a queda, estará cometendo ilícito, por
se apropriar do que não é seu. Na hipótese dos frutos caírem em
solo de domínio público, pertencerão ao dono da árvore. Por fim, é
importante frisar que o dono da árvore só poderá ingressar em
terreno vizinho para colher os frutos caídos com a expressa
autorização do proprietário do imóvel. Pois trata-se de ato de
mera tolerância do proprietário do bem imóvel, não estando o mesmo
obrigado a tolerar a entrada do vizinho.
A última situação, descrita no artigo 1.283 do Código Civil,
ocorre quando os ramos e raízes ultrapassarem a linha divisória
entre os prédios. Situação em que o dono do terreno invadido
poderá cortá-los no limite do plano vertical divisório,
independentemente de qualquer formalidade e sem gerar qualquer
direito ao dono da árvore, uma vez que é seu dever manter a árvore
em situação que não gere interferência na propriedade alheia. Pela
relevância das árvores como agente despoluidores e na regulação do
microclima da localidade, a realização de cortes só serão
consideradas quando for observado o prejuízo ou perigo iminente
que causaria a propriedade. Conjuntamente com as previsões do
Código Civil, as podas e cortes devem observar o disposto nas
legislações ambientais e regras administrativas.
A previsão dessa terceira hipótese pode ser realizada a
qualquer momento, não subsistindo qualquer prescrição à pretensão
ao corte dos ramos e raízes. Maria Helena Diniz, sobre isso,
ressalta que o dono da árvore não terá direito a qualquer
indenização de perdas e danos, ainda que esta venha perecer em
razão do corte. Uma vez realizado o justo corte, o proprietário do
prédio confinante também pode se tornar proprietário dos ramos e
raízes cortados. Agindo com dolo ou culpa grave no exercício do
direito de corte, deverá arcar com a devida indenização ao
proprietário da árvore.
4. Passagem Forçada
Prevista no artigo 1.285 do Código Civil, a passagem forçada é
benefício reconhecido ao titular de prédio urbano ou rural
absolutamente encravado, ou seja, sem qualquer saída para via
pública, nascente ou porto, de, por meio do pagamento de cabal
indenização, reclamar do vizinho que lhe deixe de passagem,
estabelecendo-se a esta judicialmente o rumo, quando necessário em
decorrência de não haver acordo, objetivando o modo menos oneroso
e mais cômodo para ambas as partes. O titular de prédio nessa
situação deverá valer-se do princípio da função social da
propriedade conjugada à imposição de solidariedade social e à
necessidade econômica de exploração do imóvel encravado, para
requisitar o direito a passagem forçada, a fim de não torná-lo
improdutivo em razão da inacessibilidade e devolver função a sua
propriedade encravada fruto.
Segundo Nelson Rosenvald, trata-se de uma das mais rigorosas
restrições de direito de vizinhança, e de um verdadeiro direito
potestativo constitutivo, pois o proprietário encravado submeterá
o outro proprietário, unilateralmente, a aceitar a sua
manifestação de vontade de constituir uma passagem, ao qual o
vizinho não pode apresentar qualquer oposição. Também sobre a
passagem forçada, explica o professor Clóvis Beviláqua que “ela
se apresenta como espécie de desapropriação restrita e
condicional, em benefício de um prédio particular, mas assentada
na utilidade comum”.
O direito à passagem forçada não será caracterizado pela
gratuidade pois é direito de vizinhança oneroso e portando cabe
cabal indenização. Para cálculo do valor justo será preciso aferir
os lucros cessantes e danos emergentes e, via de regra, é
calculada por peritos, considerando a desvalorização da
propriedade e com os prejuízos que dessa passagem possam advir ao
imóvel onerado. Se considerada indispensável ao prédio encravado,
poderá ela ser readquirida mediante pagamento do quantum
indenizatório. A indenização é considerada como uma compensação ao
dono do prédio por onde se estabelece a travessia, pelos prejuízos
e incômodos que terá de passar.
O enunciado nº 88 do Conselho da Justiça Federal assegura a
passagem forçada quando o acesso à via pública for insuficiente ou
inadequado, considerando para isso também as necessidades de
exploração econômica. A ideia de um imóvel completamente encravado
foi superada com o avanço da engenharia e, portanto, não existe em
termos absolutos. A motivação do instituto da passagem forçada é a
supremacia do interesse público. Portanto, considera-se encravado
é o imóvel cujo acesso por meios terrestres exige do respectivo
proprietário despesas excessivas para que cumpra a função social
sem inutilizar o terreno do vizinho.
A passagem forçada se dará no caminho mais curto, no prédio
mais próximo e de maneira menos onerosa para ambas as partes. Na
hipótese de existirem dois ou mais prédios pelos quais possa o
proprietário do imóvel encravado abrir sua passagem, a obrigação
cairá sobre aquele em que o caminho for menos oneroso pelas
circunstancias naturais. Entre os requisitos para o direito à
passagem forçada, o prédio deve estar naturalmente encravado. Ou
seja, não pode o isolamento derivar de fato imputável à conduta
voluntária do proprietário. Do contrário, este será considerado
impedido de requerer a passagem forçada pela propriedade vizinha.
Na situação do proprietário se colocar em situação de
encravamento, por ter alienado parte do imóvel que dava saída para
via pública. O sacrifício para obter o acesso recai sobre o
adquirente do trecho em que período anterior havia a passagem.
O direito à passagem forçada deve ser exercido por um titular
legítimo, a saber, o proprietário, usufrutuário, usuário ou
enfiteuta. Torna-se uma obrigação ao dono do imóvel onerado, que
sofre cerceamento ao seu direito de propriedade. Não havendo
concordância entre esses proprietários, a resolução do conflito
deverá ser realizada judicialmente, a fim de que o dono do prédio
contíguo aceite a abertura da travessia. Como a passagem forçada
dá corpo a verdadeira restrição legal e não uma servidão,
salientar se faz sublinha que, uma vez findada as circunstâncias
ensejadoras da passagem forçada, esta restará extinta. Conforme
leciona Maria Helena Diniz, uma vez cessada as circunstâncias que
caracterizem o encravamento, por mais cômoda que seja a passagem
forçada, esta deverá ser extinta. E, uma vez concedida a passagem,
sua não utilização, pelo período de 10 anos pode acarretar sua
perda. Entretanto, neste caso poderá ser readquirida mediante
pagamento da indenização.
Uma ação de constituição de passagem forçada foi movida pelo
dono da fazenda São José, situada em Rio Negro (MS), contra os
donos da fazenda vizinha, Rancho Grande. O trecho encontra-se
encravado pois parte de sua propriedade é separada do restante
devido a um acidente geográfico. Uma perícia realizada constatou
que a área tinha duas saídas possíveis: uma passando pela fazenda
Rancho Grande e outra pelo próprio Rio Negro. Devido aos acidentes
geográficos locais, a concretização da ligação por terra desta
última necessitava a construção de uma estrada que seria muito
dispendiosa e percorreria cerca de 30 quilômetros para sair à via
pública. O juízo de primeiro grau julgou o pedido improcedente.
Essa decisão foi mantida no tribunal estadual que considerou o
encravamento do imóvel como relativo.
A terceira turma do STJ considerou que o dono da fazenda São
José tinha direito à passagem forçada, uma vez que o trecho
encravado não tem saída para a via pública e a comunicação por via
terrestre só seria possível se fosse construída estrada que,
segundo laudo pericial, teria custos elevados e demandaria a
construção de duas pontes, um aterro e drenagem em alguns pontos.
Para o relator, o reconhecimento de que o custo das obras seria
elevado foi suficiente para reconhecer o direito de passagem
forçada. Tendo o vizinho que toleraria a passagem teria direito de
receber indenização a ser fixada em liquidação de sentença.
“EMENTA: CIVIL. DIREITOS DE VIZINHANÇA. PASSAGEM FORÇADA
(CC, ART. 559). IMÓVEL ENCRAVADO.
Numa era em que a técnica da engenharia dominou a natureza,
a noção de imóvel encravado já não existe em termos absolutos e
deve ser inspirada pela motivação do instituto da passagem
forçada, que deita raízes na supremacia do interesse público;
juridicamente, encravado é o imóvel cujo acesso por meios
terrestres exige do respectivo proprietário despesas excessivas
para que cumpra a função social sem inutilizar o terreno do
vizinho, que em qualquer caso será indenizado pela só
limitação do domínio. Recurso especial conhecido e provido em
parte.” [grifo próprio] (Superior Tribunal de Justiça – Terceira
Turma / REsp 316336 MS / Relator: Min. Ari Pargendler / Julgado em
18/08/2012 / Publicado em 19/09/2005)
5. Passagem de Cabos e Tubulações
Previsão trazida pelo Código Civil de 2002, o art. 1286 trata
da obrigatoriedade do vizinho a tolerar a passagem de cabos e
tubulações através do seu imóvel pois são considerados serviços
públicos essenciais que facilitam a vida de todos. Esses
dispositivos estão em conformidade com a tendência da norma e da
doutrina atuais atentarem aos direitos coletivos, difusos ou de
terceira geração. Entretanto, a utilidade pública somente
prevalecerá quando outra solução for considerada impossível ou
excessivamente onerosa. Observa-se que, quanto a esse direito, a
norma expressamente restringe à utilização do subterrâneo da
propriedade vizinha, excluindo-se o espaço aéreo e a superfície.
Aqui, assim como a passagem forçada, caberá indenização ao
vizinho onerado, levando-se em consideração as restrições
imediatas e as mediatas. A indenização deverá ser prévia ao início
das obras, estando prevista, também, a possibilidade do
proprietário ser caucionado por quem realizará as obras. O
numerário indenizatório deverá ser proporcional à desvalorização
percebida pelo imóvel ou ainda ao prejuízo sofrido em decorrência
do cerceamento do direito de fruir em prol do bem-estar social,
materializada pela redução do potencial do prédio, pela produção
de ruídos ou mesmo pela emissão de gases decorrentes das
tubulações.
Por fim, há que se considerar a diversidade dos materiais que
fluirá nos condutos que, em alguns casos, poderão ser fluidos
nocivos à saúde, a exemplo de gases tóxicos e combustíveis.
Portanto, “o proprietário prejudicado pode exigir que a
instalação seja de modo menos gravoso ao prédio onerado, bem como,
depois, seja removida, à sua custa, para outro local do imóvel”(DINIZ,
2004). O artigo 1.287 do Código Civil prevê ainda que, se as
instalações ofertarem grave risco, facultado será ao proprietário
do prédio onerado reclamar a realização de obras de segurança,
preventivas e protetoras, as quais deverão ser efetivadas, em
decorrência da periculosidade das instalações. Quem onerar o
prédio, incluindo-se o Poder público, deverá atentar às cautelas
imprescindíveis, sob pena de incorrer em responsabilidade civil
objetiva pelos danos causados.
6. Águas
As situações relacionadas ao tema, tratadas em regime de
coabitação entre o Código de Águas e o Código Civil de 2002, são
basicamente cinco: águas que fluem naturalmente do prédio
superior; águas levadas artificialmente ao prédio superior; fontes
não captadas; águas pluviais; e aquedutos. Quanto às águas que
correm naturalmente do superior, tanto o art. 1.288 do CC quanto o
art. 69 do Código de Águas, impõem ao dono do prédio inferior a
obrigação de recebê-las. Em outras palavras, o proprietário do
prédio mediatamente ou imediatamente inferior é obrigado a receber
e escoar as águas pluviais, nascentes ou correntes que
naturalmente escorram do superior.
Respeitando a solidariedade entre vizinhos, o proprietário do
prédio inferior deverá suportar o que advém dos impulsos das águas
em decorrência da natureza e das leis da física. Por se tratar de
direito de vizinhança gratuito, esta situação não gera direito a
indenização para o proprietário onerado. Por outro lado, o
proprietário do prédio superior não poderá agravar a condição
natural do prédio inferior quando se tratar de águas impróprias,
devendo custear obras que evitem que estas águas escoem para o
terreno vizinho. Não sendo possível deverá indenizar este por
eventuais prejuízos.
Quando as águas forem levadas artificialmente ao prédio
superior, há que se considerar uma divergência entre o Código
Civil e o Código de Águas. Para o primeiro, o dono do prédio
inferior possui o direito de reclamar que se desviassem as águas
artificiais, ou que lhe fossem indenizados os prejuízos.
Entretanto, o Código das Águas não prevê a possibilidade de
escolha, restando apenas a indenização pelos prejuízos ao
proprietário do prédio inferior, vedando a possibilidade deste
impedir o escoamento das águas.
Silvio Rodrigues apresenta os artigos 1.290 e 1.191 do Código
Civil, que trata da questão das fontes não captadas, explicando
que o dono da fonte não captada, satisfeitas as
necessidades de seu consumo, não pode impedir o curso natural das
águas pelos prédios inferiores. O proprietário do prédio inferior
tem a obrigação de receber as águas naturais do prédio superior,
assim como possui o direito aos sobejos, e aos sobejos limpos.
Acrescenta, ainda, que caso o proprietário de nascente obstrua o
curso das águas, ou as consuma de má-fé, além de suas
necessidades, pode ser obrigado judicialmente a reparar os danos
causados e a cessar os atos prejudiciais.
O artigo 103 do Código de Águas trata da questão das águas
pluviais. Segundo este dispositivo, elas pertencerão ao prédio em
que caírem diretamente, podendo o dono do terreno dispor
livremente, quando não existir direito alheio em sentido
contrário. Elas não poderão ser águas desviadas de seu curso
natural, caso em sujeitaria ao infrator responder por perdas e
danos e ser compelido a desfazer as obras erguidas para o desvio
da água.
Sobre o direito aos aquedutos, que representam o direito do
proprietário canalizar, em proveito agrícola ou industrial, as
águas a que tem direito, mediante prévia indenização, o Código
Civil prevê que os proprietários poderão cercar os imóveis e
passar sobre ele, sem prejuízo para a sua segurança e conservação.
Bem como poderão usar das águas do aqueduto para as primeiras
necessidades da vida e, havendo no aqueduto águas supérfluas,
outros poderão canalizá-las para os fins previsto em lei como
primeiras necessidades da vida, para serviços de agricultura ou
indústria, para o escoamento de águas superabundantes, e para o
enxugo ou bonificação de terrenos.
7. Limite entre Prédios e Direito de Tapagem
O Código Civil confere ao proprietário o direito de cercar,
murar, valar ou tapar de qualquer modo seu prédio, seja este
urbano ou rural bastando para tal a vontade. Nos casos em que os
tapumes sejam partilhados por ambos os proprietários, o art. 1297
§1º do referido dispositivo legal prevê a repartição proporcional
das despesas de construção, manutenção e conservação, sendo
garantido ao proprietário cobrar do vizinho confinante a sua quota
nas despesas, caso não as tenha cumprido, por se tratar de
obrigação propter rem. As situações que inspirarem a
necessidade de tapumes especiais, como quando um dos proprietários
possuírem aves e animais domésticos que exigem maior proteção,
responderá sozinho por estes. A repartição das despesas caso este
tapume especial só ocorrerá se também seja útil ao vizinho
confinante
O direito do proprietário abarca o poder de constranger o seu
confinante a proceder com ele a demarcação entre dois prédios,
fixando linhas divisórias ou aviventar rumos apagados e a renovar
marcos destruídos ou arruinados. O art. 1327 do mesmo diploma
legal considera os intervalos, muros, cercas e tapumes como
compropriedade dos confinantes, verificando-se o condomínio
necessário. O direito de demarcar, em regra, é do proprietário que
seja titular de um direito real: o enfiteuta, o usufrutuário, o
usuário, o condômino. Porém não ao possuidor direito, como o
credor pignoratício, o locatário ou depositário, tampouco ao
sucessor da herança não partilhada. Ao tratar desse direito cabem
duas ações: demarcatória ou reivindicatória. Enquanto a primeira
requer as circunstâncias de imprecisão e indeterminação de
limites, a segunda requer a perfeita indicação de limites e
individualização da propriedade, além da adequação das divisas ao
título.
As ações demarcatórias são restritas dos proprietários, pois o
conflito de limites é amparado basicamente em uma discussão de
titularidades. Ou seja, o magistrado decidirá com sustentáculo na
comparação entre títulos registrados de propriedade. As regras que
devem ser aplicadas para solucionar os conflitos de limites estão
previstas no art. 1298 do CC. Ao juiz é condicionado três passos
para julgamento. Em primeiro lugar, deve atentar para os títulos
dominiais. A petição inicial deverá ser instruída dos títulos de
propriedades, nos quais o juiz deve basear-se primordialmente para
decidir o conflito. Caso os títulos apresentados pelas partes
colidentes ou imprestáveis a título de prova, o magistrado é
autorizado legalmente a fazer uso do critério da posse, a qual
determinará os limites. Caso este critério não possibilite o juiz
formular sua convicção, ou caso a prova da posse incompleta, a lei
determina que o terreno contestado seja dividido em partes iguais.
Não sendo possível a divisão pacífica, um dos proprietários pode
adjudicar a outra metade, mediante indenização do proprietário
prejudicado
8. Direito de Construir
A doutrina consagra a construção de prédio pelo proprietário
como direito inserido no ius fruendi. Isso não significa
que o direito individual de construir não deva ser ponderado com o
direito social e, portanto, pode sofrer limitações e restrições
sempre que representar prejuízo à segurança, sossego e saúde da
vizinhança. Um exemplo das limitações ao direito de construir é a
proibição da abertura de janelas em prédios urbanos a menos de
metro e meio da linha divisória com objetivo degarantir a proteção
da vida privada dos proprietários vizinhos e, ainda, evitar que
objetos possam cair de uma propriedade na outra, causando
transtorno para os moradores. Estas limitações e restrições também
são regidas pelas regras administrativas, que geralmente cabem ao
Município.
Para se defender de construções que infringirem normas
regulamentares e preceitos de direito civil, pode o prejudicado,
no prazo decadencial de ano e dia, após a conclusão da obra,
propor ação demolitória. O magistrado verificará se é possível
conservar ou adaptar a obra aos regulamentos administrativos. Em
caso de ser impossível, ou caso exista vícios insanáveis, ordenará
a demolição da obra como última medida a ser tomada. Além da
demolição, poderá ser pedida a indenização em perdas e danos ao
proprietário causados do dano. A lei prevê, também, a nunciação de
obra nova quando esta ainda estiver em fase de edificação de sua
estrutura. E, ainda, a ação de dano infecto quando existir uma
obra que se torne lesiva aos vizinhos por estar em ruínas e com
chances de cair, causando danos aos vizinhos. Os municípios podem
embargar obras que desrespeitem as normas administrativas sem
necessitar de recurso ao judiciário, com base nos atributos da
imperatividade e da autoexecutoriedade típica dos atos
administrativos.
O dono da obra responde objetivamente pelos danos,
independentemente da discussão da culpa, pois os direitos de
vizinhança são propter rem. O construtor tradicionalmente assumia
a responsabilidade pela segurança e solidez do prédio, não se
limitando aos moradores mas também aos vizinhos. Já o empreiteiro
se responsabiliza pelos danos causados a prédios vizinhos por
constatarem defeitos de serviço, passível de indenização aos
moradores e vizinhos onerados. Segundo Silvio Rodriguez, há na
jurisprudência a previsão do dono da obra ajuizar ação regressiva
contra o engenheiro cuja imperícia, imprudência ou negligência
originou o dano.
9. Servidão
A servidão é a relação jurídica real pela qual o proprietário
vincula o seu imóvel, dito serviente, a prestar certa utilidade a
outro prédio, dito dominante, pertencente a dono distinto,
obrigando-se, em consequência, a não praticar determinados atos
dominiais no prédio serviente ou a não impedir que neste o
proprietário do imóvel dominante pratique atos de extração da
utilidade que lhe foi concedida. Não se confundem com direito de
vizinhança que cuidam de limitações ao direito de propriedade, em
caráter geral e preventivo. Os direitos de vizinhança são
imitações ao domínio impostas por lei, regulamenta a todos os
prédios e são recíprocos. Silvio Rodriguez compara ambos
institutos mostrando que a servidão resulta de negócio jurídico,
caracterizando-se pela voluntariedade, não havendo reciprocidade e
só é constituída após registro em cartório, ao contrário dos
direitos de vizinhança que dispensam registro e surgem da mera
contiguidade entre os prédios.
Há possibilidade de se confundir os direitos de vizinhança como
sendo servidões legais de forma inapropriada em decorrência da
confusão gerada pela influência do Código Civil francês. O
ministro do STJ Luis Felipe Salomão explica que as servidões são
direitos reais sobre coisas alheias, usando-se do artigo 695 do
antigo Código Civil de 1916, “por ela [servidão predial] perde
o proprietário do prédio serviente o exercício de alguns de seus
direitos dominicais ou fica obrigado a tolerar que dele se
utilize, para certo fim, o dono do prédio dominante”. Para o
ministro, as servidões distinguem-se em inúmeros pontos dos
direitos de vizinhança, “visto que estes são limitações
impostas por lei ao direito de propriedade, restrições estas que
são recíprocas e prescindem de registro”.
Um caso relacionado à confusão entre direito de vizinhança e
servidão predial foi julgado em 2011 pela Quarta Turma do STJ.
Tratava-se de proprietários de um imóvel que construíram uma
parede, que acabou por obstruir a ventilação e iluminação naturais
do prédio vizinho. Os vizinhos ajuizaram uma ação demolitória que
foi julgada procedente pelo juízo primeiro grau, determinando o
desfazimento da parede erguida. Com base no argumento das janelas
obstruídas existirem há mais de 20 anos, o tribunal de segunda
instância manteve a decisão. Nas razões do recurso especial, os
responsáveis pela construção da parede alegaram violação aos
artigos 573, parágrafo 2º, e 576 do CC/16. O ministro Luis Felipe
Salomão afirmou que os dispositivos mencionados regulam as
relações de vizinhança, não servindo para a solução de
controvérsias relativas à servidão predial e portanto seria negado
o provimento ao recurso especial.
“DIREITOS REAIS E PROCESSUAL CIVIL. CONTROVÉRSIA DIRIMIDA À
LUZ DO CÓDIGO CIVIL DE 1916. MATÉRIA CONSTITUCIONAL.
INVIABILIDADE. SERVIDÃO PREDIAL E DIREITOS DE VIZINHANÇA.
INSTITUTOS DIVERSOS. ARTIGOS 573, § 2º E 576 DO CÓDIGO
CIVIL DE 1916. NÃO APLICAÇÃO. SERVIDÕES PRÉDIAIS. NÃO USO.
EXTINÇÃO. DEZ ANOS CONTÍNUOS. ART. 710 DO CÓDIGO CIVIL/1916.
1. Embora seja dever de todo magistrado velar pela Constituição
Federal, para que se evite supressão de competência do egr. STF,
não se admite a apreciação, na via especial, de matéria
constitucional.
2. A tese acerca da vulneração dos arts.
497 e 696 do Código Civil de 1916, não foi devidamente
prequestionada no acórdão recorrido, tampouco foram opostos
embargos de declaração, razão por que deve incidir, no ponto, o
verbete n. 356 da Súmula do STF.
3. A servidão foi
constituída por ato jurídico voluntário, do então proprietário do
prédio serviente, devidamente transcrito no registro de imóveis
competente, por isso é válida e eficaz.
4. Os
artigos 573, § 2º e 576 do Código Civil de 1916 regulam as
relações de vizinhança, sendo, portanto, imprestáveis para a
solução de controvérsias relativas à servidão predial.
5. Como o artigo 710 do Código Civil de 1916 estabelecia que as
servidões prediais extinguiam-se pelo não uso durante dez anos
contínuos, o consectário lógico é que, dentro deste período, o
proprietário do prédio dominante poderia fazer uso de ação real
para resguardar os seus interesses, no que tange à servidão.
6. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido.”
[grifo próprio] (Superior Tribunal de Justiça – Quarta Turma /
REsp 207738 SP / Relator: Min. Luis Felipe Salomão / Julgado em
05/04/2011 / Publicado em 29/04/2011)
Referências
DINIZ, Maria Helena. Curso de Direito Civil Brasileiro, v.
4: Direito das Coisas. 20ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2004.
FARIAS, Cristiano Chaves; ROSENVALD, Nelson. Direitos
Reais. 7ª Ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2011.
RODRIGUES, Silvio. Direito civil, v. 5: Direito das
coisas. 27ª Ed. São Paulo: Saraiva, 2002.
Advogado e mestrando do Programa de Pós-graduação em Direito e
Políticas Públicas da Universidade Federal do Estado do Rio de Janeiro